sábado, 28 de agosto de 2021

. despedida . ou o tempo das pausas .

era agosto de 2009 quando, movida pelo amor e pelo afeto, eu abri espaço aqui, neste cantinho, pra guardar minhas palavras. 

por aqui, fiz amigos. aqui, desaguei inúmeras vezes e entendi que, realmente, algumas coisas só saem da gente por escrito. 

criei personagens e contei, através deles, uma história de amor tão minha, que acabou sendo de muitas outras pessoas. e isso tanto me confortou. sentimento bom é aquele compartilhado, dividido, capaz de se encontrar pelo reflexo do outro. é nisso que acredito...

mas sabe: há alguns meses - pra ser sincera, há quase um ano - eu deixei de me encontrar aqui. não porque as palavras deixaram de ser minhas amigas, mas porque o amor que foi tantas vezes minha razão de existir neste espaço, fez as malas de repente, se mudou sem dizer adeus e deixou marcas profundas no meu coração. feridas que permanecem abertas, ainda distantes de virar cicatriz. 

e por isso, escolhi este quase fim de agosto pra encerrar o ciclo de doze anos do . as cores dela . é preciso, sabe? faz parte do processo de cura abrir espaço no coração pra que novas palavras se transformem em poesia. eu não sei o que virá depois. talvez a gente renasça com o mesmo nome, mas de um jeito diferente, em um outro lugar que não aqui. talvez a gente tenha coragem de assumir nosso próprio nome e se encontrar entre as diversas formas da palavra em um tempo cheio de novidades. talvez a gente volte, com toda força, em um momento de mais encontro...

por hora, continuarei me preservando entre silêncios. e, às vezes, espalhando estrelas soltas em outros cantinhos. não foi fácil tomar essa decisão. mas em uma conversa com minha querida terapeuta, pude enxergar com clareza e carrego no peito a sensação de ser a escolha mais acertada. 

te agradeço por ter seguido comigo até aqui... certamente, cê é um pedacinho bom da nossa história e eu serei sempre grata por isso. não é um adeus. eu continuo ali, no @deboragtomaz_ e no emaildadeboragomes@gmail.com. e, por enquanto, este espaço continuará aberto, como um baú de memórias... 

"a sorte é como o Tour de France, 
esperamos tanto e passa tão rápido.
quando chega a hora, precisa saltar sem hesitar"
- o fabuloso destino de amelie poulain.


obrigada!








segunda-feira, 2 de agosto de 2021

. [do livro de cartas] de volta ao amor .

 querida Bisa,

é verdade quando dizem que o silêncio não combina com a gente. mas eu precisei, Bisinha. precisei deixar o vazio me preencher todo o lado de dentro, para só então conseguir vir aqui - nesse agosto de deus - te escrever algumas linhas. e contar do frio que fez nos últimos dias, do ipê amarelo da rua começando a virar flor, dos olhos verdes do moço que, por vezes, parecem me ensinar um pouco sobre o amor. mesmo diante da minha curta disposição em aprender. 

também continuo a pensar no quanto viver é cuidadoso. ganhei medos novos, aumentei algumas distâncias. e já consigo delicadamente esquecer diversos espaços do tempo que passou. no entanto, Bisa, em outras vezes pareço ter me perdido… talvez seja a ausência da escrita. ou ao contrário: pode ser que ela tenha escolhido se ausentar por causa da minha perdição. eu colocaria a culpa em Salvador se ainda tivesse forças, sabe? mas não tenho. e danei de entender que toda a responsabilidade da vida é minha. e de certo ponto, isso só pode ser bom… 

a verdade é que, tentando seguir, descobri que posso ir, aos pouquinhos, voltando a ser. e não sei até onde isso vai. só sei que o tempo aqui, enfim, tem sido a vida que sempre desejei: posso ouvir os passarinhos cantando. tenho pessoas a me sorrir pelas ruas. algumas já sabem me chamar o nome. a solidão não mais me assusta. e caminhar, então, por vezes parece colocar asas em meus pés.

eu não sei, Bisinha, até onde isso vai dar. porque melhor que ninguém, sabes que meu signo de libra com ascendente em sagitário, não me dá tanto tempo em ser raíz. mas eu tenho tentado, sem fazer esforço porque, de repente, não parece ser mais preciso fazer qualquer força: o curso das coisas está encontrando seus sentidos, como naquele clichê dos rios sempre a correr para o mar.

espero que tudo isso queira dizer alguma coisa. e que seja algo bom…

aqueça os pés, Bisinha. ouvi dizer que agosto será gelado quando chegar ao meio.


com amor,

Alice.


segunda-feira, 1 de março de 2021

. tudo pode, o nosso coração .

quando criança, aprendi com minha avó o significado da palavra "alinhavar": usar agulha e linha pra dar pontos largos e marcar aquilo que a gente queria costurar ali, no tecido. vó alinhavava barras de calça, mangas de blusas, beiradas de vestido. tudo com as mãos. depois, cuidadosamente vinha a máquina de costura fazer seu trabalho de arrematar, costurar de verdade, colocar firmeza pra não soltar nada. eu nunca soube costurar. fiz até um curso uma vez, em uma associação que recebia nas tardes de terças e quintas-feiras, com café e biscoitos, senhorinhas mais velhas. saí de lá, depois de seis meses de curso, com duas saias e uma blusa, que elas costuraram pra mim enquanto me contavam histórias e se divertiam diante da minha juventude. 

lá, no curso com as senhorinhas, eu alinhavei muito tecido. era a única coisa que eu dava conta de fazer de verdade. as saias costuradas por nóe tinham uma beirada de renda, um pouco de pregas as tornando quase rodadas. e era preciso medir, marcar, cortar tudo antes de passar a costura mesmo, da máquina. "aí a gente alinhava", elas me ensinavam. e eu fingia que não sabia porque sempre achei muito audacioso saber de todas as coisas. a ignorância, às vezes, pode ser uma dádiva. uma das nossas saias era branca. a outra, amarela com flores bem miúdas e distribuídas assimetricamente pelo tecido. como também nunca fui muito boa em quantidade, sempre comprava pano demais ou de menos. esse amarelo mesmo: sobrou de jeito que dava até pra se ter outra saia de outro modelo. mas eu não quis. um pouco porque já teria uma e duas às vezes é demais. outro pouco porque às quintas-feiras, se juntava a nós uma senhorinha que se encantou pelo tecido. aí eu o entreguei a ela, sem pensar mesmo. e ele virou uma blusa que alinhavamos juntas.

hoje, bastante tempo depois, quando eu penso em alinhavar, acho bem que fazemos isso com nossa própria vida. alinhavamos nossos passos antes de costurá-los com firmeza. pensamos nosso caminhar, ponderamos antes de ir adiante e só quando nos sentimos bem firmes, seguimos. às vezes, se não arrematamos direito, a costura solta. e é assim que aprendemos sobre a não existência da certeza ou sobre a bonita forma das coisas existirem além de nós. é assim que sabemos também que passamos a nossa vida inteira alinhavando nosso próprio coração, pra fazer dele inteiro, ainda que cheio de remendos das mais variadas cores...