domingo, 19 de agosto de 2018

. colher estrelas .




não me recordo um dia sequer em que não tenha te amado.
nem mesmo aqueles, em que chegavas logo pela manhã a me contar sobre teus outros amores, e no fim do dia dormia, sem sequer dizer boa noite.

te amei e não foi por capricho ou solidão... quem dera pudesse escolher não amar! mas nunca pude. como todo bom poeta, nasci fadado ao sentir demais, entre doses sem exagero, de um amor todo vivido pra dentro: nunca pronto, nem certo pra sair de mim.

poderias até dizer que por medo. diria eu, que por não saber bem o que fazer: onde colocar as mãos, como cuidar das palavras, em que taça oferecer o vinho, a que horas acordar para o café.
coisas pequenas. que a ti, sei, não importam tanto.

mas não me importa também que não te importe com essas minhas formas de desenhar o amor: ainda assim, todos os dias, incondicionalmente, eu te amei. desse jeito meu, imperfeito mesmo, torto, sem caber dentro de mim, sem poder me espalhar em ti.

te amei grande quando estava feliz. te amei miúdo, apertado, toda via em que percebia que amava só, e estava destinado a ser assim. pra sempre.

'sempre é tempo demais', me dirias dentro de um jeito teu de não querer acreditar em infinitos. 

e hoje, mesmo sabendo que ao lhe amar eu perdia tudo, amaria de novo, só pela alegria minha de lhe ver sorrir, ainda que isso me custasse todos os meus versos.

domingo, 5 de agosto de 2018

. [do livro de cartas] 3x4 .

Salvador, 

hoje, enquanto organizava algumas gavetas, encontrei uma foto 3x4 sua, que eu carregava na carteira antes da sua partida. cê usava aquela camisa amarela com listras brancas bem fininhas, quase invisíveis pra minha miopia. e cê ficava bonito nela, mas sempre achei que tudo aquilo era um pouco triste: o jeito que ela tinha de sempre perder um botão, o tom meio pálido que ela dava ao teu rosto, a formalidade que ela desenhava no teu jeito de caminhar. dei graças a Deus quando ela rasgou a manga d'um jeito que nem eu nem sua mãe conseguimos costurar. foi um alívio.

vê só quanta lembrança cabe numa fotografia pequenininha, Salvador? fiquei parada um tempo diante dela, como quem busca ainda dentro do olho do outro, uma só resposta. mesmo já sabendo que ela não existe. só aí eu chorei... mas não foi um choro triste, nem vencido dentro de qualquer mágoa. foi mais miúdo, mais leve, mais necessário também. entendi, meu querido, ali dentro daquele quadradinho, que o amor vai ser sempre minha justificativa. e também nossa maneira de se carregar pelo tempo, guardando mais sorrisos que adeus.

a grande questão disso tudo, é aquilo que os livros antigos já nos ensinaram: toda história carece de ter início, meio e fim. nós é que cismamos de adiar as despedidas, transformando nossa brevidade em infinito. e eu sempre serei grata por essa leveza em viver.

aqueça teu coração com chá de bergamota e jasmim. tem feito dias frios nessa tua cidade que só sabe chover...

sempre com amor, 
Alice.