quarta-feira, 23 de setembro de 2015

.do livro de cartas.

eu jamais me esquecerei, Salvador: é preciso acreditar - mesmo que com o coração sangrando - que as coisas vão dar certo. resta saber o que faço enquanto elas não se ajeitam. se saio durante as tardes quentes desse início de primavera só pra ver a rua um pouco, ou se fico aqui, dentro desse apartamento quente, esperando que o tempo passe e os meus milagres aconteçam. 

não sei mais dançar, Salvador. até cantar me esqueci. outro dia, era sábado, eu queria não me lembrar de você e fui pro bar, ver gente, descansar a solidão. mas foi aí que eu percebi que fiz tudo errado esse tempo todo. devia ter seguido os conselhos de bisa: ficado quietinha na cidade em que ela cresceu, ter aberto uma portinha pra vender doces ou artesanato, me apaixonado por um homem bom, desses de simplicidade nos pés e no coração. mas não. caí de vir pra cidade grande, uma mão na frente, outra atrás, com essa ideia fixa de escrever outra história, que não a que me deram quando nasci. 

não são bobagens, querido. são só tristezas. muitas, tantas que eu nem saberia te enumerar. que não desejo que tenhas pena, nem que volte, nem que me ajude. quero apenas vencer setembro, porque sei que se outubro passar limpo, branco, é sinal de que não vai ter mais jeito e eu vou ter de entregar os pontos. o que me sofre é essa angústia, Salvador. esse eterno excesso de perguntas, que me acompanham sempre sem respostas. essa vontade de sair daqui, construir caminho em outro lugar, recomeçar com a leveza de quem espera. 

esperança.  

que já vai dar três da manhã e eu ainda nem dormi. por isso te escrevo. pra ver se divido esses pesos com a escrita e o papel, pra ver se lembro de ter fé, crença, coragem. que amanhã faz cinco anos, desde que você resolveu partir pra seguir os sonhos que a gente não tinha; que eram só seus. e se eu ainda tenho saudade, é porque a vida se encarrega de quase tudo, menos de curar a solidão que a gente fica do outro...

Com alívio,
Alice.

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

[canção do fim de um dia]

eu queria que a gente não se despedisse. e que você fosse minha procura depois de um dia cheio de dor e desencontro. queria ter seu telefone. poder ligar a qualquer hora pra ouvir qualquer sorriso que me fizesse sentir melhor. marcar um abraço pra amanhã pela noite, só pra esperar por ele noite-madrugada-dia-tarde-ponto. mas no seu lugar tem um monte de interrogações pelo que podia ter sido.
saudade; sozinha; no vazio.
que essa solidão de você dói mais nesses dias em que a vida não tem solução.
fazer o quê?
adormeço. que esperar não espero mais não.
esqueço. porque anda me faltando coragem pra lembrar.
passo. que o caminho já anda pesado por demais pra que você seja desavença.
amo. porque minha alma nasceu no mesmo dia em que as paixões.
vivo. que não há outra alternativa, que um dia isso passa, que ainda tem esperança guardada no fundo da última gaveta da minha escrivaninha...



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The Lumineers, "Morning Song"  ♪

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

.quando?.

choveu durante toda a tarde. gosto do cheiro dos pingos tocando a terra antes da tempestade. fui à cozinha, coloquei água pro chá, e preparei a infusão com o cuidado de quem esperou aquele momento por dias. tomei a mistura de hibisco com camomila e chá verde devagar, enquanto via as gotas de chuva tomarem conta do vidro da porta da frente. respirei fundo, aliviada. foi aí que eu percebi o quanto eu amava você, mas não sabia mais sentir sua falta. e, olhando pr'aquela chuva, só desejei que as tardes continuassem passando devagar, que Paris ficasse mais perto a cada dia e que chegasse logo outubro, pra me afastar do que não foi feito pra ficar. eu sabia que você não ficaria. e, por isso, quis que meus olhos tivessem força pra não procurar mais os seus. a gente não tem culpa de nada. nem do amor, nem da falta dele. entenda. não há sonho que resista à falta de esperança, nem amor que vença sem ser recíproco, nem caminho que se abra pra corações fechados. amanhã é outro dia! e deu na previsão do tempo que há de fazer sol...

sábado, 5 de setembro de 2015

.reticências.

os primeiros dias de setembro têm sido longos e, pra uma despedida de inverno, andam bem quentes também. sorte é que aqui, no interior, as noites sempre chegam em vento, balançando as janelas com força.


embora às vezes a gente desacredite, há sempre uma ponta de esperança nas trocas de estação. encaro-as como chances de recomeço, percebendo que a vida muda não só por fora, com novas flores, céu azul, chuva e nuvens, mas por dentro, na alma.


a gente adquire, com o tempo, fé o suficiente pra ir em frente, apesar de... e é por isso que a gente engrandece o peito, coloca um ou dois sonhos na mala e vai embora e chega, quantas vezes for preciso. sem perder a crença, sem perder o amor...




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