segunda-feira, 7 de maio de 2018

. [do livro de cartas] a dor dessa partida .

querido Salvador,

sabes bem como são importantes pra mim os dias de outono. sou tomada por esperanças e encantamento, principalmente nos entardeceres com seus tons lilás-laranja-azul. por isso, sempre que ele chega (o outono), pouco me permito entristecer: guardo isso ao verão que, embora tenha lá suas razões pra ser tão feliz, não me conquista tanto quanto as possibilidades amenas dos dias mais frios.

acontece, Salvador, que dessa vez o outono se vestiu d'umas cores estranhas e que eu custei a entender. de repente, toda aquela coisa de sentir para sabê-lo vivo, se apagou de mim e do meu coração, de forma que tenho vivido como se nada, além da tua já esperada ausência, estivesse acontecendo no meio do tempo. faz com que eu me perca de todo o encanto da minha estação do ano preferida. e isso tem que acabar...

não pense, em momento algum, que lhe quero mal. mas decidi, enquanto ainda era manhã, que cê precisa sair da minha vida direito, sem meu querer indo te buscar em todos os cantos, ficando a ti reservado, apenas o lugar doce de minhas lembranças. dói, Salvador... chegar aqui ao final de outro dia e perceber no coração que esta é sim das minhas decisões mais acertadas. mas é jeito também, meu querido, de preservar os sentidos tão bonitos que me foram dados pelo tempo, desde o dia em que cê apareceu me tirando um pouco o chão.

peço que não me escrevas. e me permita viver a solidão de meu amor, tão acostumado à ausência do teu. deixe-nos quietos, aprendizes do esquecimento de recordar-te todas as horas. sei que ficaremos bem com o tempo e que, até o fim do inverno, já saberemos esboçar algum sorriso outra vez. respeite ao menos esse desejo meu e continue bordando teu silêncio com fitas de cetim.

vai ser sempre com amor,
Alice. 





Um comentário:

Jaya Magalhães disse...

Nossa.

Será que ele vai atender? Será que ele não vai acordar e enxergar que o sentimento dela de deixar ainda segue inteiro da imensa vontade maior de sempre ficar?

Essas cartas acabam comigo. Acho que nos últimos tempos andei esperando isso de Alice, sim. Mas agora que aconteceu quase que sinto doer... Você é tão bonita com suas emoções, Débora. Sempre me leva para esse mundo de poesia.

Hoje eu falei sobre o outono também.

Um beijo grande.