terça-feira, 11 de abril de 2017

. je veux voler .

era ainda tardezinha quando cê entrou pela porta dos fundos, com os olhos cheios de adeus. eu tava lá, esquentando a água pro seu 'thé de camomille', que cê toma todas as noites e que te faz dormir melhor desde que voltou. 
cê não me olhou nos olhos - achei estranho. 
nunca foi do seu feitio encarar a vida com a cabeça no chão. também não perguntei o que tinha acontecido, um pouco porque tive medo, outro pouco porque tive medo também. 
mas se cê vem e me pergunta agora: "medo de quê, criatura?", eu não saberia jeito nenhum de te explicar. 
talvez medo de que cê fosse embora ou de que me dissesse que era cedo demais pra ficar. vai ver, medo de que cê nunca mais me olhasse nos olhos ou de que cê me contasse que morreram todos os seus girassóis. medo de que cê tivesse desacreditado na gente e tivesse resolvido cortar o mal pela raiz de uma só vez. mas de tudo, o que dava mais medo, era dos seus olhos de adeus. e de que eles te levassem embora pra longe, antes do amanhecer. seria meu amanhecer mais triste: acordar, procurar por eles no quintal, não encontrar nenhum sinal do caminho que fizeram, te levando embora de mim... 
- não caibo aqui faz tempo - cê me disse baixinho, enquanto Holden cantava "Ce Que Je Suis"
aí eu entendi... que o mesmo tempo que te trouxe, também te levava aos poucos pra esse lugar longe de onde cê veio, mas nunca mais ficou.
"J'oublie, je bois, je bois l'oubli
Mais qu'est c'qui m'arrive"
- voa, passarinha - eu quis te dizer. mas uma parte egoísta do meu coração preferiu te aprisionar mais um pouquinho, até a próxima dança.




2 comentários:

Jaya Magalhães disse...

<3

Eu queria deixar um pedaço do meu coração como comentário, porque acredito que seria a maneira mais fácil de mostrar a você o que senti te lendo. E acredito mais ainda que você entenderia muito melhor do que qualquer palavra que eu pudesse deixar.

Quando o medo da gente mora nos olhos do outro, dói. Incertezas doem. Tudo porque o maior e mais sincero espelho do que somos é esse que está ali, entre as pálpebras, amarrado pelos cílios. Eu queria mesmo é que num piscar, as coisas ruins escorressem pra fora e o bom de tudo transbordasse pra dentro.

Você me emociona.

wania maria disse...

forte e delicado!! adorei!!