terça-feira, 26 de abril de 2016

[com amor]


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aprendi com o passar do tempo que chá cura tudo: gripe, dor de garganta, friagem, voz rouca, invernos rigorosos, pedras nos rins. 
acalenta a alma, encobre o peito, cuida feridas, embrulha a gente em um pacotinho quando o coração fica apertado demais e tudo que precisamos é de um instante de esquecimento...

deixei que o cheiro de limão tomasse conta do quarto e se espalhasse aos poucos pela sala. com cuidado, cada gole quente e amargo pedia que eu deixasse ao tempo tudo que as mãos não saberiam tocar mais sem doçura ou delicadeza.

não é culpa, nem desculpa, chorar um pouco quando se olha nos olhos do amor. e não se deve esquecer: o cheiro, o gosto, o som, o toque, a alegria, a vida presa em cada instante que, por pouco, não se transformou em pó. 
é que amor machuca, eu sei. mas me ensinaram que não se deve ter tanto medo assim quando há certeza no coração. 

por isso, organizo cada lembrança em seu lugar devido. 
e espero...

porque, "quem dera se a gente pudesse viver esquecendo que existe tempo"... 
que se assim fosse, seria em sua mão que a minha seguraria pra atravessar esse mundo que pede tanto que a gente tenha coragem. 

e sigo...
porque prometi... 
e porque aprendi, também, que é chegada a hora de tudo: dos encontros, das despedidas, dos reencontros, dos caminhos. 
que enquanto isso, tem um vento bom lá fora que anuncia que, enfim, esse verão vai nos deixar viver toda a calmaria dos outonos que perdemos só porque era cedo demais pra ficar...

terça-feira, 19 de abril de 2016

.avessos, atravessar.

daqui, do meu lado da rua, posso ver você abrindo e fechando os olhos devagar, como quem tem uma leve empatia por essas manhãs nubladas. eu sei que você vai dizer pra moça ao lado que apesar do frescor, você preferia estar dormindo, ou vendo um filme, ou lendo um livro, ou viajando para Paris. ela vai sorrir um pouco sem graça, dizer que você pode, porque é "só querer de verdade" e as coisas se realizam e você vai se sentir perdido outra vez, porque já lhe ensinaram há algum tempo que nem tudo é como a gente deseja...

daqui do meu lado da rua, posso ver você pegando seus óculos e guardando-os no bolso, porque "hoje não é um bom dia pra ver o mundo com nitidez". e os prédios parecem estar saturados dos seus passos e as calçadas querem, até, abrir tropeços para que você perceba, em entrelinhas, que a vida vai ser sempre um solavanco, enquanto a gente não se pertencer...

{per.ten.ci.men.to.} aquilo que faz parte de.

se não fosse esse resto de verão a se arrastar sobre nossas costas, fora de época, sem tempo nem destino, talvez não nos restasse dúvida ou solidão. mas, daqui do meu lado da rua, vejo uma longa espera, até a próxima estação. enquanto você caminha sem me atravessar...


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Cat Power, 'I Found a Reason'

domingo, 10 de abril de 2016

.amor em pedaços.

você se lembra, minha pequena, dos risos divertidos que davas toda vez que tinha 'amor em pedaços' nos potes de doce na geladeira? era tua sobremesa preferida quando criança. acho que um pouco pela acidez do abacaxi, que eu tirava com aquela calda doce, e outro pouco pelo açúcar refinado, cobrindo cada pedacinho. 
lembro como se ainda fosse hoje: achavas engraçada essa ideia de comer o amor. 
ah, amor! esse sentimento que era tão inalcançável, mas que você aprendeu, aos trancos e barrancos, que é preciso ter muita garra (e doçura) para não deixá-lo fugir por entre os dedos.
não me venha com essa tristeza nos olhos, querida. lembre desse amor que despedaçou, com aquele mesmo sorriso que me davas ao comer o primeiro doce.
o que não tem remédio, remediado está. e isso não fui eu quem inventou: foi o tempo.
apruma esse peito! lembre que é outono, e não se deve ter melancolia em nossa estação do ano preferida.

com amor (inteiro),
Bisa.

ps.: compre um abacaxi grande. reserve quatro xícaras de açúcar e duas gemas para o creme.
separe mais dois copos de leite, três ovos, duas colheres de manteiga, dois copos de açúcar, quatro copos de farinha de trigo, duas colheres de fermento em pó e o nosso principal segredo: amor, esse incondicional que tens nos olhos, no peito e nas mãos. traz isso tudo aqui pra casa na sua próxima folga. 
e vou lhe ensinar a não ter mais medo dos sabores do passado;

ps2.: talvez seja apenas impressão. e o amor esteja inteiro, ainda, onde sempre esteve. e sua miopia não te deixou ver... 

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sábado, 2 de abril de 2016

.pelo tempo.



...

você sempre pediu que eu tivesse coragem.
pra atravessar rios, pular de grandes alturas, escalar montanhas, olhar pra baixo do trigésimo terceiro andar sem vertigem.
você sempre pediu que eu perdesse o medo.
de sentar sozinha e pedir um café gelado ao garçom quando é outono, de arriscar saltos maiores que meus próprios passos, de cantar, de dançar, de amar outra vez.
você sempre temeu que eu fugisse.
e foi nessa de destemer o mundo que eu saí de casa e te deixei pra trás, sem eira, beira nem perdão.
porque eu não me perdoaria se fosse você.
mas te perdoaria, se fosse eu, e te visse partindo pra seguir seus sonhos, sem ter medos aparentes, só porque um grande coração te ensinou que a vida quer que a gente sorria, doa o que doer.

hoje eu faço as malas outra vez, devagar, como alguém que empacota a vida com delicadeza, pra não perder nenhum detalhe.
apertando por todos os lados, pra caber tudo e pra quando for a hora.
que ainda demora.
que até lá, dá tempo da gente se estender a mão e caminhar um pouco juntos.
que, se você não se importar em ouvir a mesma canção todos os dias, em ser fotografado a cada esquina, em fazer parte de cada um dos meus poemas e em usar expressões fortes como "pra sempre" e "amo você", 
vai ser um prazer não te deixar pra trás dessa vez...