quarta-feira, 21 de maio de 2014

do livro de cartas (a volta)

tem razão aqueles que dizem que não sou bom pra você, Alice. tenho imperfeições demais. acordo cedo, durmo tarde. não tenho modos à mesa. grito no bar, mesmo em dias que não são de futebol. esqueço o telefone em qualquer lugar. quase nunca respondo ou digo o que você quer ouvir. tenho um coração de vidro. e olhos que sangram ao invés de chorar. tenho a mão leve demais. e os sonhos maiores que meu corpo. escrevo poesia. não sei falar francês. me esqueço das coisas (ou finjo que esqueço) só pra poder ficar longe delas por um tempo mais longo. não sei cuidar de mim nem das minhas paredes. tenho déficit de atenção e perco, de propósito, todas as lembranças da vida.

não preciso mentir pra você, Alice. eu vou ser sempre assim. forte e frágil demais ao mesmo tempo. e é divertido me cuidar às vezes. mas sei que um dia você vai se cansar. vai sair pela porta dos fundos, só pra não ter de me acompanhar. vai dançar e rolar pela vida, enquanto eu me escoro num canto qualquer. porque amor, Alice, tem também suas horas tristes. e barras maiores do que a gente pode suportar. entenda. que insistir nisso tudo, assim, é maltratar seu próprio coração. e eu não vou lhe perdoar jamais por isso.