quarta-feira, 21 de maio de 2014

do livro de cartas (a volta)

tem razão aqueles que dizem que não sou bom pra você, Alice. tenho imperfeições demais. acordo cedo, durmo tarde. não tenho modos à mesa. grito no bar, mesmo em dias que não são de futebol. esqueço o telefone em qualquer lugar. quase nunca respondo ou digo o que você quer ouvir. tenho um coração de vidro. e olhos que sangram ao invés de chorar. tenho a mão leve demais. e os sonhos maiores que meu corpo. escrevo poesia. não sei falar francês. me esqueço das coisas (ou finjo que esqueço) só pra poder ficar longe delas por um tempo mais longo. não sei cuidar de mim nem das minhas paredes. tenho déficit de atenção e perco, de propósito, todas as lembranças da vida.

não preciso mentir pra você, Alice. eu vou ser sempre assim. forte e frágil demais ao mesmo tempo. e é divertido me cuidar às vezes. mas sei que um dia você vai se cansar. vai sair pela porta dos fundos, só pra não ter de me acompanhar. vai dançar e rolar pela vida, enquanto eu me escoro num canto qualquer. porque amor, Alice, tem também suas horas tristes. e barras maiores do que a gente pode suportar. entenda. que insistir nisso tudo, assim, é maltratar seu próprio coração. e eu não vou lhe perdoar jamais por isso.


domingo, 23 de março de 2014

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

. leve .

nunca fui muito boa com medidas. 
tamanho, peso, quantidade, sempre me saltaram demais ao coração, sem que a vida tivesse ao menos certezas.
sempre foi assim também com as perdas. nunca fui de quantificar: sempre ergui tijolinhos no dia seguinte ao vendaval e me protegi na "muretinha" que, conforme o tempo foi passando, cresceu e ficou mais forte.
talvez seja assim mesmo: quanto mais a gente cresce, mais se defende do sofrimento porque mais tem dimensão do quanto dói a dor. 
algumas feridas viram cicatriz sim, mas eu concordo também com Cecília (a Meireles) quando escreveu que

"há uma saudade sábia
que deixa as coisas passarem
como se não passassem"

há sofrimentos sábios também. perdas sábias. feridas sábias... 
e todas as coisas sabidas, passam e a gente às vezes nem vê: quando pisca, já era. 
não sei como que é isso tudo, nem onde vai parar.
só sei que tem dias que a gente só precisa que a vida seja como um vento.
e, ainda assim, ela insiste em "tempestuar"... 




terça-feira, 28 de janeiro de 2014

. de ontem, vinte e cinco .

guarde bem essas palavras, minha querida: você também vai envelhecer. suas pernas também deixarão de suportar o peso do mundo. seus ouvidos se contentarão ainda mais com o silêncio. e teus olhos terão muito cansaço para suportar seu corpo de pé.
portanto, cuida hoje do teu coração, dos teus passos, da tua solidão.
porque no fim,tudo que lhe sobrará serão as lembranças.



terça-feira, 7 de janeiro de 2014

. entre .


Quando estiveres triste, minha pequena, lembre-se daquela canção de verão. Ela vai confortar sua alma e, algumas vezes, vai também te fazer chorar um pouco. Mas não pense que é por mal. Nunca é. A gente ainda não aprendeu a medir os próprios sentimentos. E eu ainda não consegui descobrir em qual altura da vida eu deixei o amor. Já parei sim pra pensar que talvez ele nunca tenha aparecido. Por isso andamos tão ausentes [um do outro] ultimamente.


Gal vai cantar a noite inteira e não vai te deixar dormir, eu sei. A mesma canção. Repetidas vezes. Enquanto você pensa. E escuta. Atenta. Você não pode ver o Rio de Janeiro como diz a letra, é verdade. Mas nem por isso ela vai deixar de ser a sua canção.


É por pouco tempo. Eu garanto. Logo essa melancolia vai passar. E você volta a sorrir suas alegrias tristes. Daqui a pouco é carnaval...

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

. pela volta .

de onde eu vim não existe pressa.
todo esse passo apertado e meio cego foi tomando forma com o tempo. assim como a vontade do silêncio e o amadurecimento da solidão... 
lá, de onde vim, também não existe vazio. 
porque tem sempre alguém na rua. tem sempre alguém em casa. o telefone nunca deixa de tocar com boas notícias. Roberto (o Carlos) acorda os domingos. os pés de fruta no quintal estão sempre cheios. tem sempre espaço pra jogar conversa fora. tem sempre café quente no fogão.
de lá, eu trago os abraços mais apertados. os sorrisos maiores. a esperança mais forte. os sonhos mais concretos. a única certeza de amor.

às vezes eu paro e fico me perguntando por que vim. 
- talvez porque fosse mais difícil ter ficado. 
- talvez porque era necessário.
- talvez... eu nunca vá descobrir pra poder explicar.
só sei que, embora tristes, chegadas e partidas me devolvem sempre uma espécie de paz.
é como se eu pudesse recomeçar sempre, mesmo que não seja janeiro.

... antes eu tinha medo. hoje, eu me reservo silêncios...